Rio Grande do Sul: dramas e glórias de uma geografia central

Muita gente pode estar considerando o Rio Grande do Sul hoje como um lugar especial de provações, pois tem sido declarado como a região mais vulnerável às mudanças climáticas do Brasil, e em consequência também do Continente. De fato não seria de espantar que as novas disfunções atmosféricas atingissem esta região com uma força toda especial, e também por razões que os estudos convencionais não costumam contemplar. 

Está certo que o Estado possua o maior espelho d’água do Brasil e conta-se entre os maiores da América Latina. O tema das águas está com efeito impresso na história do Rio Grande do Sul, já a partir do seu nome. As amplas lagoas dos litorais refletem esta situação, típicas de zonas de inundação, como águas represadas pelas areias movidas pelos intensos ventos oceânicos da região. A geografia do Estado é um retrato do embate milenar entre as força cósmicas que não permitem ser facilmente domesticadas. 

Mas tudo isto é apenas consequência do especial resultado do Efeito Coriolis na região, acarretando zonas de alta pressão atmosférica. Acontece que o RGS é cortado ao meio pelo paralelo 30, que é uma faixa central bem conhecida dos geógrafos e dos climatologistas, e que nós denominamos como “Mesosfério”. Ali se encontram as duas grandes correntes opostas geradas pelas derivas atmosféricas dos polos e do Equador, resultando em correntes marítimas intercontinentais, ventos fortes constantes e torvelinhos atmosféricos, incluindo os famosos ciclones sazonais do Sul dos Estados Unidos que periodicamente devastam cidades inteiras. No Sol o mesmo movimento é responsável pela eclosão das manchas solares.

Assim tudo isto é apenas consequência do especial resultado de uma condição central planetária, sujeita a correntes atmosféricas de potência única. Contudo -e naquilo que talvez seja o mais interessante de tudo-, é que nesta zona as quatro Estações são simetricamente equivalentes no ano, como uma perfeita mandala climática. Isto se agrega pois à centralização das duas grandes correntes atmosféricas, a polar e a equatorial. Alguém duvida que tudo isto tenha também importantes reflexos culturais -para além das decorrentes misturas raciais e fronteiras disputadas?!

Não seria por nada afinal que justamente nesta faixa foram edificadas as grandes pirâmides e os zigurates, erguidos o Apadana persa e o Potala tibetano, organizada a primeira universidade (que foi a de Taxila na Índia) e esculpidas as séries de moais na Ilha da Páscoa. Já se assinalou a região como berço da civilização e nascedouro dos avatares. Enfim talvez seja esta a maior zona da geografia sagrada planetária, simbolizada pelo venerado Monte Kailas do Tibet.

Impactos históricos

Certamente este é um Estado importante sob vários aspectos, e desde o ângulo econômico tem sido a quarta economia nacional há muitas décadas, perdendo apenas para os principais Estados do Sudeste. Hoje ainda se chama a esta região do Continente de “Sul”, o que deverá mudar contudo assim que formos capazes de descolonizar a nossa geografia e dar-nos conta do verdadeiro significado das direções cardeais. Sob certas perspectivas autócnes a zona pode ser considerada como central no Continente e também setentrional no país.

O grande impacto deste evento climático não foi humano, pois comparativamente com certas tragédias menos abruptas e agressivas algumas centenas de mortos numa região de 282 mil k2 (do tamanho do Equador ou do Marrocos) não é uma soma tão expressiva. Porém o significado cultural do acontecimento é imenso, até porque se mostra cada vez mais forte e recorrente.

É certo que se tratou de uma situação dantesca, digna de qualquer filme apocalíptico. Um terremoto é sempre algo localizado, porém esta enchente transtornou um território do tamanho de um país inteiro. Em termos locais os problemas ambientais também eram então no geral localizados, atingindo pequenas comunidades periféricas ou mesmo algumas poucas cidades. A exceção eram as queimadas do Pantanal e sobretudo as secas da Amazônia, que ainda assim parecia atingir regiões remotas e pouco habitadas. As enchentes de 2024 no Sul contudo impactaram o conjunto de uma região organizada com parques industriais, comércio pujante e produção agrícola essencial para o país. Isto significa que a escala dos problemas também está modificando - e é claro que não poderia ser diferente, porque as respostas da Natureza precisam acompanhar a própria escala das transformações que o ser humano também está fazendo na Natureza. Fatos assim atraem olhares preocupados de todo o planeta e obriga a levar a sério os acontecimentos. 

O Estado serviu assim como um verdadeiro laboratório do apocalipse, norteando ações futuras em outras regiões. O próprio governador do Estado chegou a declarar que este Estado teve esta provação porque a sua população estava preparada para en-frentá-la.

Um primeiro efeito local foi observado nas enquetes através de uma ampla adesão à percepção das mudanças climáticas, reduzindo assim substancialmente o fenômeno do negacionismo que vinha sendo até então observado. Mais ou menos nesta linha também se passou a observar maior união dentro da sociedade nacional até então muito dividida, tendo o exemplo dos políticos, que também reviram as suas posturas divisionistas, com uma referência para a população, num quadro que atrai naturalmente também o apoio internacional. O desencadeamento de uma grande onda de solidariedade desta magnitude pode mudar -ou despertar- uma nação para aquilo que realmente importa.

Mais uma vez confirma-se assim a importância do sacrifício na evolução da consciência coletiva, e o fato de envolver o Mesosfério nisto é também inteiramente natural por se tratar da energia de Shambhala. A crise ambiental do RGS apenas dramatiza uma tendência planetária já em curso. Os profetas destas gerações anteciparam o dilúvio futuro, mas não souberam prever o caos dos elementos que antecede a esta condição final. A enchente intermitente também é uma forma de dilúvio, pois torna praticamente inabitáveis grandes áreas, tal como arriscada a agricultura ostensiva. Contudo alguns ainda tentarão adaptar-se -entre outras soluções- na forma da vida ribeirinha através de barcos e de palafitas, como é comum na Amazônia e na própria Índia, cujas monções sazonais também atingem latitudes análogas. As monções são consideradas vitais para a fertilidade de todo o sul asiático, e o futuro demonstrará o papel que as chuvas terão no sul brasileiro no tempo de temperaturas crescentes que já vivemos. 

 É até possível enfim que outras regiões não cheguem a sofrer tanto como esta no futuro, de todo modo ela seguirá sendo altiva, atrativa e atuará como escola para forjar cidadãos conscientes, resilientes e participativos.

Naturalmente onde há luz também existe trevas. Alguém acreditaria hoje que o Rio Grande do Sul tem um rico histórico ambientalista?! Gaúchos que desmatam e queimam a Amazônia, o Cerrado e o Pantanal desequilibram o clima de todo o país e sua terra agora colhe as consequências. O carma existe. E o Brasil todo é a próxima vítima.

Diante de tudo isto apenas se chega a uma conclusão e em decorrência a uma grande indagação. A conclusão é: trata-se com certeza de uma antecipação do Apocalipse. E a pergunta que surge é: a Civilização resistirá?


* Sobre o Autor:

Luís A. W. Salvi é estudioso dos Mistérios Antigos há mais de 40 anos. Especialista nas Filosofias do Tempo tradicionais, publicou a Revista Órion de Ciência Astrológica pela FEEU e dezenas de obras pelo Editorial Agartha. Nos últimos doze anos vem redirecionando os seus conhecimentos para a Teosofia, realizando uma exegese ampla da Doutrina Secreta e também das Estâncias de Dzyan.

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