Teria a Teosofia nascido num período de evolução setentrional
natural do mundo, ou será que as ideias teosóficas foram influenciadas
pelo setentrionismo ideológico? Eis uma pergunta que não pode calar.
Ao lado das suas três proposições básicas –formar um núcleo
da fraternidade humana, estudar os textos sagrados e pesquisar os poderes
secretos do homem e da Natureza-, duas coisas sobretudo afamaram a doutrina
teosófica: a ideia dos Mahatmas e a questão das raças-raízes. E é nesta última
que se acham alguns dos fatores mais polêmicos da moderna teosofia, em função
de tudo o que envolve a ideia de “raça”.
Talvez tenha passado amplamente desapercebido, que uma das
razões do enorme sucesso da Teosofia, se devesse justamente ao caráter
essencialmente setentrionismo da sua doutrina. Quer dizer: as pessoas estavam
celebrando uma filosofia que lhes dizia que o seu próprio tempo e lugar estavam
na crista da evolução do mundo...
Não obstante, apesar dos esforços por formular e organizar os
ciclos do mundo e da humanidade, através de uma autodefinida “Astrologia Esotérica”,
é público e notório que a Teosofia jamais forneceu uma astrologia realmente palpável,
científica e tradicional ao mundo. Ainda assim, suas concepções vagas e confusas
serviram aos propósitos imediatos da instituição, de exaltar o setentrionismo. Afinal,
aquilo que estava claro ali, é que o Norte ainda carregaria longamente o facho
da evolução do mundo. Outras regiões tiveram ou ainda teriam a sua vez, mas por
muito tempo ainda –na verdade, um tempo quase atemporal das ideias teosóficas-,
o Norte ainda seria o seu porta-voz.
Para sustentar estas posições, a Teosofia teve
nada menos do que... contestar frontalmente a Ciência, naquilo que diz respeito
à evolução humana. Antropologia e paleontologia foram indiscriminadamente misturadas,
resultando num misticismo que mais afasta do que aproxima o grande objetivo sintético
da Sociedade Teosófica de “promover a síntese entre ciência, religião e
filosofia.” O estreitamento com as religiões do Oriente emprestava um certo álibi
setentrionista, mesmo porque também ali as concepções astrológicas costumam ser
vagas, sobretudo no hinduísmo e no budismo.
Na verdade, em quase toda parte
a imprecisão dos ciclos tradicionais é hoje mais regra que
exceção, e a neo-teosofista Alice A. Bailey assume isto como uma fatalidade, ou
uma necessidade por “medida de segurança”. Através de uma grande síntese de informações,
contando também com os recursos da Ciência, é possível alcançar porém um
panorama bem diferente das coisas.
Afinal, a escora dos ciclos védicos não se sustenta de todo, e o próprio “Glossário Teosófico” (em boa parte organizado após H.P.Blavatsky) acabou trazendo chaves para os ciclos tradicionais e -estes sim- científicos. Se resgata daí o baluarte do Grande Ano de Platão e seus hemiciclos, chamados corretamente pelo astro-mundialista Andre Barbault de “o dogma máximo da astrologia”. E com isto se teria uma aproximação entre as ideias de raças e de rondas mundiais.*
Também seria possível apelar para os importantes ciclos de cinco mil anos, buscando avaliar a evolução espiritual da própria raça árya, ciclo este que estaria em plena transição na atualidade, já que maias e hindus definiram o seu começo há cinco mil anos. Aqui, começamos a tratar o tema em termos de cultura, isto é, antropologia, mas ainda relativamente ligadas às raças e seus continentes.
Ora,
as caraterísticas mais pontuais da civilização árya (como é a Civilização) não excedem este período de
cinco mil anos, na chamada “Idade dos Metais” da Ciência. E o mesmo se pode dizer
no tocante à raça atlante, como cultura da religião e da agricultura, no chamado
Neolítico da Ciência. E assim se poderia prosseguir, apesar das mudanças
anteriores serem cada vez mais sutis e subjetivas. Então, se a “raça” possui
cinco mil anos, os subciclos áryos já se encontram esgotados, e a nova raça
raiz, anunciada para todas as Américas, também se acha vigente.
Raças ou culturas étnicas? |
O marco de Itaparica, Eubiose |
De forma algo providencial, cedo começaram os esforços para
se criar uma teosofia meridional e brasileira, através daquela entidade atualmente
conhecida como Sociedade Brasileira de Eubiose. Infelizmente, a Eubiose tampouco
realizou esforços objetivos no campo da astrologia esotérica, mas trouxe uma nota
mais local ao enfatizar a Geografia sagrada, mesmo que amplamente envolta em
mitos ainda, que fora amplamente ignorada na “teosofia original”, fora das formulações
sobre “raças-raízes”. Naturalmente, o “sucesso”
social no país da Eubiose se deve basicamente ao mesmo umbilicalismo que afamara anteriormente
a Teosofia, desta vez focalizada no Sul (Brasil). Atualmente é a Escola
Agartha que assume este bastão, para auxiliar o processo vigente da transição planetária.
Afinal, este Sétimo Continente que é a América do Sul, está destinado
a sediar a Era de Aquário; como afirmam sábios como Serge Raynayud de la Ferrière
e a mensageira Elizabet Clare Prophet. O Martinismo, espécie de teosofia
francesa, também decidiu investir neste Meridionismo. E a ciência da Geosofia,
a Geografia sagrada, representa a doutrina-mãe para credenciar esta manifestação
final da luz na Terra.
Resumo
Não seria simples coincidência que o grande sucesso da Teosofia tivesse por pano de fundo a exaltação do mundo aryo, reunindo eurocentrismo, setentrionismo e orientalismo -refletindo da mesma forma as origens dos principais fundadores da Sociedade Teosófica.
Sob o enquadramento de calendários raciais deveras vagos, a América do Norte era colocada então no saguão de espera, mas já se sentiriam os eflúvios da sua emergência. Tudo isto acontecia com efeito na virada de um século que veria já a grande ascensão Norte americana sob o impacto das duas grandes guerras.
Ao Sul, todavia, se condenava simplesmente a uma espera resignada de incontáveis éons. Não casualmente frentes se levantaram contra esta situação, buscando visões alternativas, mesmo dentro da própria Europa.
Coisa que não seria realmente difícil alcançar, sob as luzes de muitas astrológicas distribuídas pelo mundo. Na verdade muitos destes conhecimentos estavam na ocasião pouco acessíveis, e neste vácuo foi fácil disseminar a mistificação.
Estas buscas e revelações também se seriam inspiradas pela percepção de que o materialismo parece ser uma tendência dominante de todo o grande Norte -tal como, obviamente, os graves males resultantes da exaltação de raças já consolidadas e historicamente poderosas.
A Espiritualidade saudável recomenda trabalhar espiritualmente apenas com os Chakras latentes visando desperta-los, e não com centros já consolidados sob risco de sobrecarregar as suas energias e desequilibrar o indivíduo. O mundo tem pago um preço muito alto pelos erros dos místicos.
Notas:
* Pois se as raças-raízes possuem 12 mil anos (contra o mito teosófico de um milhão de anos), isto nos lança ao começo da evolução superior do homem há 50 mil anos (segundo os dados da Ciência), por estarmos “no final da quinta raça-raiz.” O começo destes hemiciclos se daria em Câncer e Capricórnio (“porta dos homens” e “porta dos deuses”), de modo que rumamos para uma renovação, e toda a Era de Aquário pode ser considerada como transição. Surge então a questão das sub-raças, naturalmente atreladas às eras e aos milênios do Ano cósmico. Os últimos milênios da raça ou da ronda atual, estariam atrelados às “sub-raças sintetizadoras” (cf. Bailey) da raça árya. E se uma sub-raça equivale a uma Era, Aquário já corresponderá ao subcontinente americano setenário que é o meridional.
Luís A. W. Salvi é filósofo holístico e autor polígrafo com cerca de 140 obras, e na última década vem se dedicando especialmente à organização da "Sociologia do Novo Mundo" voltada para a construção sócio-cultural das Américas.
Contatos: webersalvi@yahoo.com.br
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